OS CAFAJESTES TAMBÉM VÃO PARA O CÉU

Breve perfil de um fora-da-lei do amor

Clichetes
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por Ana Campos, em São Paulo

R odovia Fernão Dias. São pouco mais de seis horas da manhã, mas o sol já esquenta o asfalto. O trajeto é o mesmo de todos os dias, São Paulo — Atibaia, sentido casa — trabalho, e o movimento tranquilo nas pistas conserva a rotina. Na altura de Mairiporã, um Clio 1.6 prata inquieto sinaliza ultrapassagem. “Vou deixar passar, depois vou atrás.”

A estrada não chega a ser fácil. Curvas, retas, subidas, descidas, mas os familiarizados conseguem se manter a mais de150 km/h. A brincadeira ganha velocidade. 170 km/hnas retas. Ora o Renault dispara, ora o desafiado Fiesta 1.6 prata deixa o rival para trás. No volante do primeiro, uma mulher. No do segundo, Emilio, nosso protagonista.

A disputa dura cerca de 20 km. Na entrada de Atibaia, os dois reduzem velocidade e seguem um ao lado do outro.

– Me passa seu telefone!

A motorista não hesita e grita os oito números, anotados rapidamente por Emilio. Ainda assim, nas traseiras de seus respectivos se forma um pequeno mas impaciente acúmulo de carros e buzinas.

Na manhã seguinte, o encontro para um café revela que ambos são comprometidos. Verônica, que pode ser um nome falso, é casada; ele mora com a namorada há cerca de um ano. Mais dois cafés na mesma semana e acabam na cama dela, transam e assim fariam pelos próximos dois meses.

“Da minha parte, era só sexo. Da dela, acho que começou a rolar sentimento. Ela falava que, nas raras vezes que transava com o marido, pensava em mim…”.

O caso terminou depois do Carnaval de 2009, mas o relacionamento de Emilio só acabaria em 2011 sem nenhuma menção ao nome Verônica.

VERBETE

Ca.fa.jes.te.; adj. atribuído a pessoas do sexo masculino mestres na arte da conquista, da persuasão e da pegada, irresistíveis a mulheres com tendências masoquistas; compreende homens enquadrados a duas subcategorias: 1. sedutor, vaidoso, insaciável, obcecado pelo sexo oposto; 2. sutil, camaleônico, multifocado, apaixonado pelo sexo oposto. Subst. M. que sabe exatamente o que, como e quando falar, com grande capacidade para iludir e talento para fazer promessas sem prometê-las, por meio de atitudes fofas; sofre do distúrbio do donjuanismo, preso à liberdade, viciado em sedução, bem-dotado de charme e habilidoso em demonstrar pseudociúme.

SEM VERGONHA E SEM JUÍZO

Nosso anti-herói nunca foi fiel a uma namorada. Emendou namoros por dez anos, dos 15 aos 25, mas o número ele não sabe precisar. Perdeu a virgindade aos 14, na Alemanha, com uma brasileira também virgem. No dia fatídico, foram flagrados pela relapsa camareira do motel que abriu a porta “bem na hora H”, recebendo em troca xingos em “alemão, português, inglês”. Superado o constrangimento, oficializaram enfim a conjunção carnal. Sua recordação mais remota de safadeza vem dos 8 anos aproximadamente, quando surpreendia as priminhas tentando abraçá-las e beijá-las.

Tudo isso Emilio me conta nos primeiros dez minutos de conversa. Chegou ao bar combinado vestindo calça jeans e uma camisa polo branca por baixo de uma jaqueta de couro, que tirou logo ao sentar. Suas peripécias sexuais inauguram a entrevista, que foi interrompida por umas quatro ligações. Só atendeu uma, a do trabalho.

Se ele titubeia na hora de me responder quantas namoradas teve, responde com exatidão o número de mulheres com quem transou. Isso porque mantém uma planilha no Excel, categorizada por ano, atualizada desde a sua primeira vez. “Ontem eu transei com a minha número 106”. Não sabe responder por que faz isso. “É uma coisa que eu comecei”.

Essa é apenas uma das minhas perguntas que ganharam ar de inquisição. Espontaneamente, elas pareciam soar como um pedido de satisfação, às vezes quase como um recalque –como se ele tivesse que responder por todos os dramas que vivi e pelos que não vivi. Sim, porque mesmo pelas experiências que eu não passei, quando o questionava, parecia que eu me tornava uma eterna e rancorosa vítima de cafajestes e de suas traquinagens e que, de alguma forma, ele me devia as explicações que eles não me deram.

Emilio nasceu em São Paulo, mas seu sotaque paulistano costuma perder a vez para o R do interior quando fica à vontade. Formou-se em engenharia de produção em Mauá e trabalha numa empresa em Atibaia, onde mora sozinho. Vai à academia pelo menos três vezes por semana e sempre volta à capital nas sextas-feiras para ver os amigos e a família. Gosta muito de carros e de dirigir. Aparenta ter a idade que tem, 27. Seu cabelo castanho é liso e um pouco ralo próximo à testa. Não é alto nem baixo, nem gordo nem magro. A barba por fazer contorna o rosto redondo de nariz gorduchinho.

Começou a namorar cedo e ficava no máximo três meses solteiro entre um relacionamento e outro. Agora, vive um recorde pessoal. Desde o término com Fábia (a namorada traída do começo desta história), em abril de 2011, não se envolveu sério com ninguém.

Nesse nosso primeiro encontro, exalta a liberdade e avalia com convicção, “tenho a minha família, os meus amigos, o meu trabalho, gosto muito do que eu faço. E, também pela facilidade de conhecer novas mulheres, hoje em dia eu não sinto carência nenhuma”.

Naturalmente, os dados na planilha do Emilio se multiplicaram. Foram 10 em 2010 contra 30 em 2011. Ele e os principais parceiros de balada, Hugo, Fernando e Alexandre, inventaram uma competição para ver quem era o “comedor da turma”. “A gente começou uma disputinha saudável. Mas chegou uma época em que eu tava me dando tão bem, que o pessoal não acreditava. Aí a gente começou a tirar foto das mulheres com quem a gente transava e a mandar pros amigos. Isso é uma coisa de cafajeste”, adianta.

“Por exemplo, ontem, conheci essa menina”, me mostra a foto de uma loira com quem está abraçado na balada.

- Ah, sim.

- Essa aqui foi semana retrasada.

- Ai meu deus.

- Assustou? Desculpa se eu te assustei. Acho que você não imaginava a surpresa, né?

Não. Era a imagem de uma mocinha de pé totalmente nua e aparentemente distraída. Desviei o olhar por instinto, em sinal de preservação de intimidade –reação espontânea, evidente.

- O que a gente faz: a gente desliga o flash. Finge que vai mandar uma mensagem pra alguém ou mexer no Facebook, e tira a foto. Aí manda pros amigos.

Digo que vou alertar minhas amigas.

- É, fala pras suas amigas tomarem cuidado. Meus amigos solteiros fazem isso até hoje.

“Hoje em dia, a coisa tá, entre aspas, fácil”, continua. “A gente vai pra balada, principalmente balada sertaneja, e a mulherada quer curtir também. Aí a gente vai ficar com uma, duas, três, quatro, cinco, sei lá quantas, e a que a gente percebe que vai rolar, a gente pergunta: ‘vamos voltar juntos?’.”

UMA COISA SUPOSTAMENTE DIVERTIDA…

Do chão ao teto, tudo é revestido de madeira no Villa Country, balada sertaneja da zona oeste de São Paulo. O cenário imita os saloons de filmes de faroeste, com acréscimo de luxo e requinte. Numa sexta-feira, a entrada é R$ 30, sem consumação. No meio da pista, um bar circundado por uma ferradura gigante abriga em seu centro um obelisco de bronze de um peão montado num touro. “Irrraaa” é o que me vem à cabeça todas as vezes que busco uma Brahma lata de R$ 6.

Levo comigo uma amiga eclética adepta a ambientes sertanejos para me ajudar na missão de seguir os passos do meu objeto de observação. Por isso, quando chego, não tento me contatar com ele na esperança de flagrá-lo.

Quase duas horas se passam, porém, e o movimento no salão de entrada (que recebe o sugestivo nome de Praça do Cavalo, descubro depois) continua tranquilo. Muito tranquilo. Já bisbilhotamos o glamouroso John Waine Restaurant, assistimos a uma série de clipes sertanejos, vimos uns dois ou três casais a caráter (chapéu, bota, calça justa, cinto de fivela, caso alguém tenha dúvida) arriscando uns passos no canto direito da pista e alguns grupos conversando em sofás e mesas no canto esquerdo.

Admito o fracasso da minha empreitada de detetive e mando uma mensagem de celular. “Emilio, tudo bom? To no Villa Country. Onde vc tá?”. “To perto da fonte.” “Uai, eu também”. “Dá uma volta nela que você me acha.”

A fonte que observo é impossível de ser contornada. Penso num sentido metafórico, “que a fonte nunca seque”, o brinde de muita gente, e decido procurá-lo em volta do bar-ferradura. Nenhum sinal.

Nos damos conta, então, de uns degraus na lateral esquerda da porta por onde entramos, uma passagem totalmente ignorável –antecipo em legítima defesa. Subimos, e, diante dos nossos olhos inexperientes, uma multidão é embalada por uma banda que toca do sertanejo ao pop internacional. Estamos no Saloon. A minha noção espacial apurada só me habilita dizer que o salão é enorme. O site da balada não me dá a área exata, mas assegura caber mil pessoas. Impressionável.

Mas não vejo a tal fonte do Emilio. Seguimos desbravando o Villa Country de verdade e caímos na Praça Sertaneja. À distância, percebo jatos de água saindo de um touro prateado. Achei. Dar uma volta pela fonte de uns três metros de diâmetro, porém, tornou-se tarefa quase desumana. Aglomeração, suor, passos de dança.

Tudo ali é bem iluminado e explícito, diferente do Saloon, com seus jogos de luz. Descobrimos que olhar nos olhos de alguém poderia ser comparado a fazer topless bêbada pela rua durante a madrugada. Andei de cabeça baixa. Deixamos alguns rastros de cantadas impessoais e nos parecia impossível encontrar Emilio em meio ao tumulto, quanto mais surpreendê-lo.

Eis que a sorte sorri para mim. Incentivada pela amiga eclética, ultrapasso a cerquinha que separa a pista da fonte e tento observar o ambiente de um novo ângulo. Certeiro. Lá estava ele, a centro-oeste do meu campo de visão, ao lado de sua presa, e pude assisti-lo sossegadamente sob algumas gotículas.

Sua saga não parece muito difícil. A jovem morena de vestido justo e curto (popularmente conhecido como vestido de periguete graças à Natalie Lamour, papel de Deborah Secco na novela “Insensato Coração”) está visivelmente interessada –concluo pelo jeito de acarinhar o próprio cabelo, pela curvatura de um cochicho, pelo sorriso fácil. O beijo não demora a acontecer, dura um minuto, Emilio fica mais dois por ali e sai para dar uma volta.

Vou em sua direção quando o vejo retornar. Troco umas palavras com a sua donzela, chamada Valquíria, e ela é taxativa: “a palavra que define o Emilio é sedução”. Segundo ela, nosso protagonista tem um jeito de olhar… E suspira.

Enquanto estou por ali, uma mulher alta puxa Emilio de lado e não parece feliz. Descubro que ela não gostou nem um pouco de vê-lo com Valquíria. Como resposta, ele deu a clássica: não aconteceu nada.

Um dos grandes amigos solteiros, Hugo, um mocinho loiro de estatura mediana, fala para mim que Valquíria é uma mulher camarão (bonita de corpo com rosto discutível). Emilio faz que o ignora. Concordam que a balada não está muito boa. Para eles, tem muito homem, mulher feia e rolaram até brigas. “Alguma coisa tá estranha”.

No Villa Country, tanto as mulheres quanto os homens parecem estar em uma fase de teste do esquema fordista de produção. A grande maioria delas opta por vestidos curtos e justos e saltos altos; eles apostam na camisa polo e calça jeans. Situação similar à da paulistana rua Augusta, com homens e mulheres desfilando suas vestimentas xadrez, que, amalgamadas, resultariam numa palheta de cores infinitas.

Na parede lateral da Praça, vemos um traje clássico da dupla Tonico e Tinoco enquadrado ao lado de outras relíquias –uma espécie de versão caipira do Hard Rock Café. O Villa possui também uma loja que vende camisas, botas de cowboy, chapéus e camisetas de ídolos. Segundo uma atendente, muita gente vem do trabalho e quer trocar de roupa, aí vai direto lá. Chapéus e botas são os itens que mais saem.

Ao deixarmos a lojinha, uma moça abraçada com dois caras insiste que eles precisam de um look completo para continuar na balada. Com menos esforço físico do que psicológico, eles a convencem de que ela está muito bêbada e a carregam até a Praça Sertaneja.

A caminhada investigativa continua e, nos lugares onde paro, onipresentemente está Emilio com uma dama diferente.

POR QUE ELE?

Segundo pesquisa de amostragem simbólica com mulheres entre 20 e 30 anos, o principal motivo para boa parte do sexo feminino ter deficiência imunológica contra cafajestes é o desafio de conquistá-lo.

EMILIO POR EMILIO

“Eu me considero um cara bonito, não vou mentir pra você. Também, se eu não achar, quem vai? Mas, na verdade, a pessoa não precisa ser bonita. O mais importante é a autoconfiança. É uma coisa que eu adquiri com o tempo, com a experiência mesmo. Não sou 100%, lógico. Tem dias que eu troco várias vezes de camisa, igual mulher. Quando eu saio, gosto de me arrumar. Uso jeans, sapato e camisa pra dentro da calça, normalmente. Sei conversar bem, sei fazer as mulheres rirem, sou muito pentelho e brincalhão. Sei que as mulheres se sentem à vontade comigo. Mas eu também sou bem franco, não prometo nada, falo que não quero nada sério. Gosto de sair, de fazer as mulheres se sentirem atraídas por mim. Se eu puder conhecer uma nova por dia, eu vou conhecer. Não me canso. É uma diversão, não sei como te explicar. Saber que eu ainda consigo seduzir uma mulher… Não é só vaidade, é essa sensação. O sonho masculino, pelo menos pra mim, é transar com duas ao mesmo tempo. Aí tem a ver com ego. É algo que eu nunca fiz. Mexe com a minha imaginação. Na cama, eu gosto mais de dar prazer do que de receber. Uma coisa que eu não sei, mas quero aprender, é dançar. É um negocio que, meu, se souber dançar bem, você não precisa nem falar com a menina. Você vai lá, dança e já beija. É atração pura mesmo. Sei xavecar, sei brincar, sei fazer a pessoa rir. Mas sou humilde, simples, não me acho melhor do que ninguém. Sou carinhoso, bem educado, abro a porta pra mulher entrar no carro, pago a conta, elogio bastante. Talvez, por isso, elas se sintam bem”.

O TAL DO VÍCIO

Emilio apostou em Valquíria para “voltar juntos” do Villa Country, mas ela se esquivou. “Aquela morena queria abusar do meu corpinho na pista e só”, me conta pelo Facebook no dia seguinte. O saldo da noite daquela sexta-feira foi seis.

Ele diz não ter um tipo de mulher. Ela pode ser tímida, extrovertida, séria, desde que se divirtam juntos. Idade também não interfere, já transou com cinquentonas e pós-adolescentes de 18. Só se sente intimidado com mulher muito bonita, rola um frio na barriga. Sua restrição é quanto à beleza artificial, silicones e afins. “Não vou sentir mais tesão pelo tamanho do peito.” E entoa o discurso que ainda não convence boa parte das afilhadas de Vênus, “o que importa mesmo é a química, o toque. Celulite, estria, varize, isso, na boa, não importa”.

Para ele, a mulher ideal não pode ser ciumenta. “Mas você provoca!”, retruco. “Ah, depende! Por exemplo, fiquei com alguém muito antes de conhecer minha namorada, aí ela me manda uma mensagem falando que tá com saudade. O que eu posso fazer? No Facebook, eu posto uma foto, aí vem uma menina e comenta ‘nossa, como você tá lindo’. São coisas que fogem do meu controle.” Entendo. Quer alguém que seja parceira, que não cerceie sua liberdade e insiste, “beleza não é primordial”. Sexo é importante, mas elege a interação como fator principal. A atração física vem em segundo lugar. Preza ainda pelos que trabalham. “Não gosto de pessoas que, entre aspas, são vagabundas.”

Acha bom quando elas tomam iniciativa, admira a coragem e gosta de se sentir desejado. Diz não recriminar mulheres galinhas. Nem julgar quem transa na primeira noite, mas… “também não vou namorar com ela, né”, ergue as sobrancelhas, esboça um biquinho. “Eu tô julgando uma pessoa por algo que eu também faço… Mas a gente fica com a impressão de que é fácil… E a primeira impressão é a que fica, não tem jeito”.

Sobre a canalhice, Emilio fala que a mulherada tira sarro, não chega a brigar com ele, não. “E eu não prometo nada. Sei que já magoei muitas vezes as mulheres e eu me sinto mal por isso, porque eu sou um cara que me coloco no lugar do outro. Mas eu era mais imaturo e acabava fazendo coisas só pra me dar bem, entre aspas. Não gosto disso, não quero mais magoar ninguém.”

Para abordá-las na balada, nosso cafa tem uma cantada eficiente. “Geralmente eu chego com uma piadinha… Você vai achar ridículo”, “Haha, eu não acho nada!”, mais risos. “Essa ninguém rejeitou: eu chego do lado, aí falo no ouvido dela, ‘Posso fazer uma pergunta? O que você faz da vida além de ser modelo?’.”

MINISTÓRIA DE DESAMOR

Vrrr. Vrrr. Celular indica mensagem nova. Ela pega e vê o remetente. “É ele! ‘Oi, linda, tudo bom? Bjosss’… Numa terça-feira, às duas tarde? Ain, fofo! Deve estar a fim!”.

Versão Emilio: Eu parei com isso, mas era assim: mandava mensagem coletiva pra umas 10, “só passando pra deixar um bjiinho e desejar uma boa semana”.

EMILIO POR MARCELA

“Nos conhecemos no Villa Country, dia 7 de setembro. No estacionamento, eu já o tinha visto. Ele estava bebendo, e uma amiga falou pra mim “Olha que gatinho”. Olhei bem rápido, mas não reparei nele. Aí quando entramos, minha amiga mostrou “Olha ali, Ma!”. E eu olhei. Vi aquela barba maravilhosa (risos)… O que me encantou foi o olhar. Ele tem um olhar muito penetrante. A gente ficou se encarando, aí ele veio com um papo muito furado de “além de ser modelo, você faz o que?” (risos). É a cara dele falar isso… Bobo, bobo! Mas foi engraçado. Ele é engraçado. Sedutor, conversa bastante. Ficamos, trocamos telefone e no outro dia ele me ligou. Marcamos um cinema e conversamos mais, nos conhecemos melhor… Desde então, todo mês saímos juntos. Me sinto muito à vontade e segura perto dele. Temos os mesmos assuntos, nos damos bem, parece, assim, que nos conhecemos há muito tempo, porque temos uma intimidade muito gostosa. Ele é carinhoso, sabe me ouvir, dá risada das minhas conversas. Mas também já brigamos muito… Ah… Senhor Emilio, né. É cara de balada, não quer nada com nada. Você sabe o que é engraçado? Ele sempre me liga de madrugada. Tipo, sai da balada e me liga, perguntando onde eu estou, fala que quer me ver. Eu atendo e falo “Você tá bêbado, né, Emilio?”. Aí ele fala: “Só um pouco, linda, mas quero te ver”.

UM AMOR A DOIS PROFANA

Quando Emilio começou a sair com Verônica, a casada do começo, fazia pouco mais de um ano que namorava Fábia. Ele já a havia traído, mas esse caso em Atibaia, em especial, marcava um momento diferente para ele.

“Eu estava superfiel, era um namorado exemplar, cuidava muito bem dela. Mas não parecia que ela tava feliz comigo por mais que eu fizesse o possível e o impossível por ela. Parecia que, quanto mais eu me doava, mais ela queria.”

A queixa de Emilio sobre a aparente insatisfação crônica de Fábia não chega a ser uma novidade no universo feminino. “As mulheres continuam focando no que falta, esperando os homens corresponderem às suas demandas”, avalia em entrevista à revista TPM a antropóloga Mirian Goldenberg, autora de, entre outros livros, “Por que homens e mulheres traem?”, de 2010. À apresentadora Marília Gabriela, Mirian comenta: “Quando pergunto o que falta em uma relação, as mulheres dão uma lista interminável. O homem diz que falta compreensão”.

Emilio, como de costume, voltava para São Paulo todas as noites. Fábia, segundo ele, continuava fria e brigando por nada. O peso na consciência começou a se desfazer. “Quer saber? Que se dane.”

O Carnaval 2009 se aproximava e os amigos o chamaram para ir a Águas de Chapecó, em Santa Catarina. “Vou dar um migué.” Orquestrou tudo com os colegas do trabalho para sustentar a mentira de que iria participar de uma manutenção em uma fábrica no Sul (!) durante os quatro serpentinados dias de folia. A mãe também foi sua cúmplice. “Ela sabe que eu sou jovem, que tenho que aproveitar.”

Fábia é dois anos mais velha. Já pensava em casar e em ter filhos, hipótese que Emilio chama de “a maior cagada” –apesar de admitir a possibilidade de mudar de opinião.

Filhos não tem vontade de ter, não tem paciência com criança, ainda mais com criança chorando. Odeia. Para ele, os pais se esforçam demais pelos filhos, que muitas vezes acabam desapontando-os.

Não acredita em casamento a exemplo do que viu acontecer entre tios, família de amigos, seus pais. “Meu pai é muito mulherengo, sempre foi.” Divorciaram-se quando Emilio tinha 25, e o irmão, 22. “Ele já tinha traído várias vezes e chegou num ponto que a minha mãe não estava mais feliz e decidiu tomar uma decisão.”

Na sua opinião, o que pode levar à traição é:1. ainfelicidade no relacionamento;2. anecessidade de autoafirmação;3. a(o) companheira (o) não o(a) satisfaz;4. adiversão puramente. Mas resume: “acho que é da natureza do ser humano, principalmente do homem”. Apesar disso, nunca teve nem cogita ter uma relação aberta. Diz que nunca foi traído, mas que, com certeza, ficaria muito mal. Acha que não conseguiria perdoar se rolasse sentimento entre a sua amada e o amante dela.

Emilio viajou para Santa Catarina e, quando voltou, “aquele negócio” estava aberto. “Eu curti tanto, foi muito gostoso, muito divertido. Percebi que o que eu tava precisando era da minha liberdade, ter meus amigos de volta, sair, curtir, aproveitar a vida”.

Terminaram. Voltaram. Terminaram. Foram pelo menos 8 vai-e-vens. Fábia foi por quem ele mais sofreu, talvez a única por quem tenha sofrido. Sobre as ligações que recebeu durante a entrevista, conta: “e você acredita que a gente não se fala faz, mais ou menos, seis meses, e uma das pessoas que me ligou agora, e eu não atendi, era ela?”.

DRAMAS DE UM CAFA

No final do nosso primeiro encontro em novembro, Emilio já estava mais desarmado. “Não sei se hoje em dia eu não me apaixono porque não apareceu ninguém ou se eu me bloqueio pra isso.” Em janeiro, na nossa última conversa, disse que tinha “mudado um pouco”. Reduziu a pegação de inúmeras para uma por noite. Disse que estava privilegiando a qualidade.

Espanta-se quando calculamos o tempo que está solteiro –quase dois anos. “Isso dá um pouco de carência, sabe? Só tenho ido pra balada, conhecido a mulherada e ido direto pro motel.”

Lembro da ligação não atendida da Fábia meses atrás. “Mandei mensagem no dia seguinte. Ela disse que vai se casar em abril, mas que ainda me ama. Ficava triste por não termos dado certo, mas estava feliz com o cara.”

- Passou pela cabeça tentar uma reconciliação?

- Olha, passou sim. Mas sei que não vai dar certo. Conheci muitas e muitas mulheres depois dela. Já tentamos tantas vezes. Não mudou muita coisa. Mas, para namorar ou ter algo sério com alguém, só tenho vontade com ela.

35 nomes fecharam a lista de 2012 da planilha de Emilio. Em 2013, anotou três. “E ontem só não foi a 4ª porque a menina tava sem documento. Fui em dez motéis, cinco lotados, cinco não deixavam entrar sem RG… Que raiva.”

*Para preservar a identidade dos entrevistados, nomes fictícios foram usados nesta matéria

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